quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Memórias do Matadouro

Lembra o desencarnado de seus últimos momentos de vida terrena...
Já não tenho forças para me mover, meus braços estão quebrados, e o gosto ácido do sangue escorre por minhas narinas e boca... Sinto o cheiro pútrido de carcaças que se deterioram ao sabor do vento, e com o vento ouço as árvores que balançam fora do barracão... Sinto dor, muita dor, e começo a me lembrar da última vez que vi a luz do sol. Era uma manhã de quinta-feira, estava indo pro trabalho quando de dentro do meu carro fui abordado por dois homens. Será que minha família sente a minha falta? Não sei quanto tempo estou aqui, só sei que cinco pessoas já foram mortas na minha frente, uma delas cuspiu sangue sobre meu rosto enquanto era cortada em pedaços, e essa imagem não sai da minha mente. Queria poder pedir desculpas aos meus pais, pois dívida é dívida, e sei do meu destino. Meus sentidos estão se esvaindo, como álcool evaporando ao vento, e já não consigo abrir os olhos, pois foram queimados em brasa... Um homem entra no barracão, já conheço essa cena, pois a vi por cinco vezes, e espero que seja a minha vez, pois não estou mais agüentando. Sem desferir sequer uma palavra, com a frieza de um açougueiro, ouço os passos, e sequer uma palavra. Pegou algo, mas não vejo, será uma faca? Será um serrote? Meu Deus, que meu sofrimento termine logo. Os passos se aproximam, e sinto uma pancada forte, certeira, e fatal em meu crânio. Agora estou aqui, nesse vale imundo, repleto de podridão e rostos desfigurados. Meu Deus me ajude, alguém me ajude, estou arrependido, quero mudar, quero viver!
Pobre rapaz, só Deus sabe quanto tempo ele vagará sem destino pelo vale da morte...

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